O cachorro que vi comia feijão com arroz misturado, e não parecia estragado. Não comia ferozmente, como era de esperar. Comia deliciando-se, como se aquilo fosse a melhor comida do mundo. Ao olhar aquela cena, juro que me senti tão estúpida a ponto de quase chorar. Estúpida no sentido de ter tantas opções de comida, e ainda dizer ou pensar "tenho fome". É inconsciente, força do hábito, mas uma pessoa ou animal com fome faz do mínimo o máximo. E nós cotidianamente fazemos do máximo o mínimo. E isso me fez sentir tão pequena e imbecil frente àquele cachorro.
Era só um cão com fome. Um cão feliz em encontrar comida. Tão feliz que não a devorava, mas a degustava. Comia devagar, de olhos fechados, como se desejasse que aquilo nunca acabasse. Sim, aquele feijão com arroz abandonado no lixo por alguém que acreditava que aquilo não prestava. Foi um manjar para aquela criatura sofrida. Sem brincadeira, ele só faltou sorrir. Observei-o bem, ele se deliciava com prazer. Nunca vi animais terem prazer, mas enganei-me muito.
Aliás, os animais também têm sentimentos. Minha cadela Jamaica é super brava, mas é só eu chamar o nome Kiss que ela meio que pára para pensar. Kiss foi uma cadela que tivemos que foi como uma mãe para ela. Dei o mesmo nome pra uma cadela que veio depois, e Jamaica teve várias oportunidades de dar boas mordidas, mas em vez disso cheirava a cabeça dela, só pelo fato dela ter o mesmo nome que a outra cadela. No dia que a Kiss 2 fugiu, ela ficou do mesmo jeito que quando a Kiss 1 morreu. Se a Kiss 2 tivesse qualquer outro nome, a história não seria bem essa, com certeza.
Mas voltando àquele cachorro. Refleti muito sobre ele. E creio que se as pessoas parassem mais para olhar à sua volta, entenderiam melhor e valorizassem mais suas respectivas vidas.
Fica a dica ;)